25.12.10

ADMIRAÇÃO

Lá fora
Um sol
Avisa da vida
Que dentro
Queima


Uma lua
Que lenta
Pousa

É céu!

E um cão
Que a tudo contempla
Guarda no olhar
Horizontes
De segredos

23.12.10

POEIRA

AQUELAS PALAVRAS NO PAPEL PARDO PELO TEMPO
PENDULAVAM NAS PÁLPEBRAS
PUERIS
UMA ESPERANÇA PERDIDA


ERA A POESIA
PAIRANDO
PELA FRESTA
ABERTA
DA PORTA


ERA A POESIA


ESSA


INSISTIA EM NÃO DORMIR
ENQUANTO HOUVESSE VIDA
BIRITANDO SUOR


NUMA ESQUINA




1.12.10

ININTERRUPTO

Penso muito
E o tempo todo

O tempo todo
E a cada instante

Nunca cessa!

Penso muito
E me perco
Por muito pouco

NOTA

E na segunda feira
Que chove
Nas pedras
As árvores
Silenciam
O vento

Momento de admiração!

É ela ao piano

Sou eu no encanto

É ela ao piano.

11.11.10

?


O existencialismo
É como a uma esfera
Solta no vazio

Involuntária
Define trajetos
Retos
Tortos
Introspectivos
Nada tímidos

O existencialismo
É...

METADES

A poesia
Está para mim
Como o sol
Está para a lua

Não opostos
Complementares
Mas duas faces
De um mesmo espelho
Límpido

Siamesas

Inconfundíveis
Se juntas

Inacabadas
Se separadas

9.11.10

ATOR (para Odilon Esteves)


Mineiro
De alma
Brasileiro
De coração
Menino
De sorriso
Olhar
De mansidão

Poderia inverter tudo
E não haveria confusão
Nesse palco
Da vida

Nem basta uma rima
Para tanta estrela
Que ele solfeja
E excita

É ator,
Um Thor

Que na boca
De cena
Arrepia
A cortina
Que tímida
Se abre
Em aplauso

4.11.10

PEIXES



Tanta vida
Em tanta cor
Que ouso sentir
Com a imaginação
As texturas

Belo encontro
De sorrisos
E olhares
Atentos
Na vastidão
Do nada
Que baila
Na água
A maciez
Do falso sol
Que brilha
O instante

POMBOS


Observo pombos
Ouço arrulhos
Sinto o vento
Das asas
Curtas
De voos
Curtos

De telhados
A telhados
Sob o forno
Das telhas

Observo pombos

Indiferentes
Sacodem-se
Ao ar
Enquanto
Lentamente
As nuvens passam

19.10.10

ASAS

Num relâmpago

Surgiu

Vestida De luz


Deixei-me pousar


Tão leve

Levantei vôo

Em seu olhar


Decolei

Desejos

No escuro

Sem guia


Acordei cinza,

Desbotei de tanto sol.

17.10.10

SUSPENSÃO

O silêncio
Lamenta
Em algum canto
Sob uma luz
Fraca
E amarela
Enquanto
O soro
Lento
Pinga

Farrapos
De vida
E uma barata corre

Percorre o ferro
Fosco
E desgastado
Que descasca feridas

O sangue ora jorra
Ora seca
Mas todas as manhãs
Os pássaros cantam

15.10.10

FRAGILIDADE

Como qualquer objeto
Leve
Que flutua
Ao vento
Ao sopro
Ao sussurro

E pousa
Quieto
Arfante
Em superfície

À espera
À espera
À espera

Do imensurável

12.10.10

É

É, veio morar em mim
Como onda faz com mar

Veio devagar
E cresceu,
Me tomou
Inteira

É, como luz de vela
Me acendeu
E no centro da chama
Despertei

Cílios ao vento

É, cá estou
Erguida
Ao sol

CÃOPANHIA


Meu cachorro marrom
É cadela
Sou dela

No despertar feliz
Que enrosca na cama
Pupilas de mel
Chuva de pêlos

Meu cachorro marrom
É menina
Só minha

Nos passeios
Diários
Nas confissões
Noturnas
Uivos pra lua

Meu cachorro marrom
É linda
E tem ao vento
As cores da Frida

11.10.10

LUTO


A poesia não existe em época de campanha.
A poesia chora sangue pelos filhos teus que a negam desavergonhadamente.
A poesia entra em coma e o pau come.
A poesia clama paz e o povo silencia em guerra.
A poesia desconhece poetas. Poetas?
A poesia é andarilha e faz questão de fugir do caos
Do cais
Dos ais.
A poesia não espera.
A poesia é festa
Em época de lamentação.
A poesia é a feliz contramão.
A poesia me salva
Me samba
Me lambe
Me guia
Nessa época de escuridão.

9.10.10

PARTICULA(R)

E era tanta cola na fogueira
Que as achas voltavam a ser árvore

Crepitavam oxigênio
No instante exato de purificação

Pela testa escorria
Pelas pernas euforia

E era tanto, tanto
Que o redor desmoronava
Intacto

7.10.10

DO CÉU

Lá vem a chuva!

Grita o céu
Com seus pulmões
Inflados
Por segurar
O fôlego

Vez em quando
Tosse
Na cabeça
De quem passa
E apressa
O passo

Árvores dançam folhas
Gotas
Verdes

E qualquer calha
Vem a calhar
Como vento
Em asas
De pássaros

4.10.10

CLARÃO

Vontade de ir a uma exposição
E ver o tempo parar
Em seus movimentos
Milimetricamente
Desconexos

Ir
Sem medo
Ao desconhecido
Das cores

Entender
O que não se explica
Confundir-me
Em razão
E perder-me
Lunática

Me encontrar

Num cumprimento
Olhar-me nos olhos

Piscar
Num segundo
E me expor
Na ação
Descontínua
Do caos

Liberdade, liberdade abre as asas sobre nós!

Se o fundamentalismo conduz ao erro é previsível ser testemunha da febre vermelha que assola o país. Não tenho partido e tampouco me prostituo por cargos comissionados. Sou a favor da voz da igualdade num jogo político tão de$igual. O facciosismo nesses tempos eleitorais fez com que eu me vestisse de descrença. Os valores foram todos escoados pelo ralo. Antes de defender a candidata 'preferida' à presidência e fazer valer suas propostas, seus eleitores mais preocuparam-se em atacar os oponentes com declarações explícitas de pequenez. Muito me admira ver 'pai de família' exercer a infantilidade egóica de dar chiliques em redes sociais sem perceber que, nesse instante, está cuspindo pra longe o respeito a liberdade de expressão. Como se fazer ouvir se não sabe escutar? Como se existisse uma verdade absoluta! Onde está a democracia?
Dona D. é isenta de qualquer defeito, desconfio nem ter celulites tamanha idoneidade. A melhor em todos os debates, disparada a melhor! Galopa como puro sangue molusco. Aiou Silva!
A cidade está imunda e a ladainha continua por mais um mês. Nunca desconfiem do poder da oração, foi ela que trouxe o descabido 2º tempo. De nada adiantou tantos megafones cantando vitória. Já não se tem Nostradamus como antigamente.
E vi tanto policiamento em frente ao palco armado para comemorar o 'campari' (enquanto as satélites sofrem por falta de segurança), vi tanto confete (e nem é carnaval), ouvi tantos planos individuais (quando se deveria pensar no coletivo)... E NUNCA ANTES NA HISTÓRIA DESSE PAÍS tantos rabinhos foram enfiados entre as pernas. E a onda do Mar vai ser suplício para Iemanjá!

1.10.10

JABUTI


O Jabuti
Andava
Sem parar
Para chegar
A algum lugar

O Jabuti
Era sábio
Em sua lentidão

_ Ora, mas o tempo é relativo!
O Jabuti
Era sábio
Em sua exatidão

E foi assim

Numa tarde
Sem trovão
Ele abraçou
Menino Zito
O escritor
Do meu coração



Meu parabéns a José Rezende Jr, um dos vencedores da categoria "Contos e crônicas" do Prêmio Jabuti por "Eu perguntei pro velho se ele queria morrer (e outras histórias de amor)" da editora 7Letras

29.9.10

TERRITÓRIO

o conforto
da paz
externa
traz pontes
e multidões

são aviões
velozes
rompendo nuvens
em busca de terra
firme

no buraco do olho
na asa da borboleta,
na pele áspera e
austera

(que pousa sobre a outra a cicatriz)

27.9.10

ALEGRO



Ela sonata meu dia
Três movimentos
Ou quatro

Pés
Cabeça
Coração
E eu de quatro


Ela movimenta
O ar
Por onde
Passo

26.9.10

ALGUÉM? (para Raissa Abreu)

No escuro
Do expediente
Haviam sonhos
Que lustravam
Balcões
De padaria

No escuro
Do expediente
Havia sol

Nos batons
E badulaques
Das meninas
Que faziam-se mulheres
Enquanto meninas

E era tanta festa
Silenciosa
Que de um trovão
Inesperado
Brotava lágrima

22.9.10

PIANNA

O colorido
Sonoro
Que acorda
Com tônica
Minha pele

Representa
Aleatoriamente
O sistema
Que me rege
Nessa lua

Caio atonal

E a harmonia
Como a uma pintura
Impressionista

Libera
Os contornos
Que compassos
Constroem
Em escalas
Meu ♥

16.9.10

ENCANTO


A Guanabara não está aqui

Mas a imensidão
Que me cativa
Salta dos olhos
Dela
Direto para os meus

Desejos
Benquistos

Vejo
No escuro
De suas pupilas
O brilho
Raro

O piano
Ainda não tocou
E já me encanta

13.9.10

INFUSÃO

O amor se dissolve
Qual torrão de açúcar

E quando isso acontece
Não é preciso cerimônia

Basta sentir
O doce
Que se esconde
Ao fundo

10.9.10

SEU ATAÍDE

Seu Ataíde
Me aborda
E oferece uvas,
Pergunta do bebê
E o bebê
É minha cadela

Me conta de outra época
Lembranças do internato
Do latim
Da feliz reclusão

Casou-se aos 30
E nunca mais voltou para casa

Hoje é visto
Garboso
Com sua cabeleira
Branca
A sorrir
Simpático

'Qual o seu nome?'
_ Anna
'O nome da minha avó!'

E assim
Continuamos
Nossos caminhos
Opostos

De mãos dadas

9.9.10

Seguimos
Sigamos
Suamos

E a falsa segunda
Esparramada
Espreguiça-se

No sonho
Que doura
O olho

* para Carmen Sílvia Presotto
http://vidraguas.com.br/wordpress/

2.9.10

ATEMPORAL

Num dia
De clarão
A lembrança
Causará
Cegueira

E abrirá cicatriz

Do sangue:
Jorros
De açúcar
A tornar o instante
Encorpado

Coágulos
De vontades
Interrompidas

Que plantaram
No solo
Da pele
Uma esperança
Em coma

A sanguessuga
Aventura
Da vida
Prossegue
Post Mortem

Em escalas
De cinza

É quando os olhos
Ardem
O esforço
De ver

E a lágrima
Derradeira
Cairá
Num dia
De clarão

Enquanto da lembrança
O coração
Será cego

1.9.10

ENTÃO

E agora Anna?


O encanto acabou

Como surgiu:

Avassalador


O livrei

Do meu corpo

Como amarras

Fortes


As mesmas

Que quis

Em nossas peles

Quando havia lua

No baixo do céu


Anna mudou


Para longe


Para perto

Dentro

De si

PASSAGEM

O barulho
Do trem

Sobressai
O silêncio
E os pedaços
Dos diálogos

Ao telefone

O sol
Entra,
Desimpedido
O calor

A imagem
Me entontece

Estou prenha
Das gentes

31.8.10

BREU

A contemplação
Silenciosa
Grita
Nas frestas
Nos cantos
Nos vãos

Em vão
A impotência
Perante
O notívago

Apago a luz
Para ver melhor
E a casa
Finge
Que dorme

* em diálogo com 'Sobre a Casa' de Fabiana Motta
http://nexogrupal.blogspot.com/2010/08/sobre-casa.html

28.8.10

LONA

desculpa por afastar o sol do seu sábado
uma peneira seria mais elegante

minha gentileza travestiu-se do indelicado

pequei sem ser santa
quando propus abrir meu coração
e despejar em suas mãos
gotas de tranquilidade

me reconheço
ao desconhecer

e o amanhecer trouxe trovoadas.

desculpa por eu ser má
malandra em corda bamba

nem sempre o circo é feliz

não sou domadora
nem trapezista
estou mais para escafandrista

27.8.10

OUTRA ONDA



O sal me lambe as entranhas

E apaga qualquer sofrimento

O mar é azul

Meus pés

Marcam na areia

O encontro do acaso

Construo castelos

Ao vento

Ah eu quero navegar sem âncora

Me atirar ao fundo do oceano

Livre me farei perguntas
Solta me trarei respostas

E o sal

No canto da boca

Vai embora

26.8.10

SUSPIRO

Gradualmente
As vistas
Ficarão mais cansadas
Que o habitual

As pernas
Dançarão
Bambas
Pelas ruas,
As mãos
Serão fracas
Perante
Os copos

Na face: rugas
Cavidades da vida
Marcas do tempo
Coração em pêndulo

Subitamente
A memória
Falhará,
Fechará
O cerco

Irão amores
Amigos
Mementos

A espinha
Ereta
Curvará
Em cumprimento
Eterno?

E a fragilidade
Será sem-vergonha

Inevitavelmente
Cairá em leito
Num sopro
Horizontal

Será fatal
Por ter sido
Humano

INTERVALO

Está suspenso
O momento

E a demora
Arrasta
Brusca
A chuva

Desaguará
Em bifurcações
Ilusão?

No reverso
Continuarei
Meus passos,
Os melhores

E de lá
Versarei
A teus pés
O que seguro
Firme
Entre
As mãos

EU LUA

A lua
Está cheia

Lotada
De sentimentos
Que transbordam
Aos olhos
O branco
Que contrasta
O que é (ou está)
Turvo

Instantes
Duradouros
De admiração
Que nos engole
Absorve

Permito-me
Antropofagicamente
Além
Dos ossos
Que sustentam
Meus pilotis
Frágeis

Seguimos
Imanadas
E a estrada
É traçada
Ao vivo

24.8.10

RIMA

o viço da pele
no cio da carne
nada fere
tudo arde

a flor dos poros
no fogo da língua
abre os olhos
fecha a míngua

o susto do fôlego
na cicatriz da unha
traz o trôpego
afasta a munha

a trança das pernas
no umbigo do mundo
solta as feras
...

e as prende no fundo

23.8.10

TRILHAS



Colocou no ‘headphone’ uma música feliz. Ensaiou um balançar de cabeça e um sorriso tímido. Fechou os olhos. Era assim que as pessoas pensavam melhor. Era quase ano novo.
Enquanto a música tocava aguou as plantas, fez brigadeiro, arrumou a mochila, calibrou os pneus. Enquanto a música tocasse seria feliz.
Pegou a estrada e saiu sem rumo, sem companhia, sem olhar para trás.
Não fazia sol, nem chovia. O céu estava nublado e isso a confortava como se atingisse um equilíbrio temporal. Algo tinha de ser controlado nesse acaso, pensou. Acelerou.
Chegou ao começo da noite a seu destino, mas não sabia que o sentido de destino seria prolongado, se daria conta no instante em que o sol queimasse seus cílios e o mulato lhe beijasse a boca.
Quinze anos passariam até que ela saísse outra vez, dessa vez um pouco cansada, um pouco feliz e muito confusa.
Voltou ao lugar de onde saiu e não reconheceu nada, nem a parede descascada, nem o cão que lhe afagou os pés, nem a música que ainda tocava no mesmo ‘headphone’. Só soube estar ali quando viu a fotografia na estante. Estava amarelada, mas os lábios do mulato ainda ardiam.
Desligou a música, chamou o cachorro para dentro, mas não conseguiu dormir.

21.8.10

QUILOMBO

O negro
Abraça
O tronco
E sangra

O chicote
Corta
O couro
E Costura

As grades
Gritam
Gemem
Grunhem

E um sol
Aponta
Dentro
Dos olhos
O amanhã

Azul

Sedento
Por suor
Livre

A escorrer
Na pele
Negra
O sal
Da vida

.

O negro
Semeia
A semente
E sorri

A água
Apazigua
A alma
E a alimenta

As pombas
Pairam
Pousos
Poéticos

E uma lua
Recolhe
Fora
Das mãos
O ontem

Cinza

Minguado
Por seca
Acorrentada

A marcar
Na pele
Negra
O doce
Da morte

19.8.10

FIAT LUX


A aRtE NaScE dE uMa BrInCaDeIrA pErMiSsIvA.
NeM pErVeRsA, nEm OmIsSa.


18.8.10

ESTIRPE

Dei um passo
Rumo ao insustentável

Tive convicção

Ao longe
Avistei
No espelho
Meus olhos

Distingui:
ao invés de pés,
asas!

17.8.10

EIXO

Eu
No meu centro
Inacabado
À sombra
Do futuro
Essa nuvem
Carregada
De imagens
Ao som de um disco
Ininterrupto

Respiro
Expiro
Aspiro

Mundos
Mundos
E mundos

A cabeça não dorme
O coração não descansa
Operários
Sagrados
Em territórios mundanos

A lua pisca
Para informar
Que está viva

Viva
Dentro
Daquilo que mato
Por subir em tentação
Sem salto

15.8.10

AZULZIM


Minha porção
Anjo Azul
Ajoelha
Em minha frente
Como oração
Que a um coração
Ateu
Purifica

Fora
Da janela
Um céu
De igual azul
Salta
Em minhas costas
Como manto
Que a um manco
Plebeu
Enobrece

SOLAR

O astro rei
Se põe
Majestoso
Na frente
Dos meus olhos

Não se acovarda
Diante
Meu suspiro
Cambaleante

Seu brilho
Me ofusca
Sinto-me
Gueixa
E a estrada
Roda
Minha contemplação

Ele puro
Fogo
Eu corrosiva
Água

Nessa tarde
Que anoitece
E aqui
Dentro
Acontece

14.8.10

SÚBITO

Sorri
E é como o sol
A romper
Silencioso
A euforia
Dos dias

A pele
Morena
Acalenta
A lua
E minhas tetas

Me alcança
Com seus
Braços

Me estico viável

Incansável

ESTRANHAS

Estranhas
Criaturas
Que se reconheceram
À meia luz
Da lua

Quando o sol surgiu
Permanaceram
Estranhas

E no clarão
Dos olhos
Estranhas
Se viram
Espelho

Raios nas entranhas

De tanta estranheza:
Siamesas

NUDEZ

Corpos
Brindam
Com suor
O encontro

Simples
Como essa poesia
Que me despe
Corada

No sexo
Das entrelinhas
Tudo

Menos mudez

Grito mãos
Falo olhos
Sussurro letras

Coito
Poemas

ANDARILHA



me resta
arrumar
a mochila
e mudar

de você

em versos
curtos
sumo
sem destino

na interrogação
me encontro
nua
e minha crueza
tem sabor

amargo
é o sol
após chuva
que alivia

castiga
o tempo
ausente
de segundos

no coração
vagabundo

13.8.10

MANDINGA



mandinga
é seu perfume
que cai
em gotas
oceânicas

e deixa um rastro
sem medida
entre as coxas
das meninas

reúno
todos os orixás
em transe
num templo

embriago-me
a tempo

12.8.10

FLOR DE FOGO

Chegou
Miudinha
Numa noite
De maio,
Trouxe palavras

Levantou
Sol
Noutro dia
De chuva,
Abriu janelas

Adorou
Meus olhos
Em hora
De vazio,
Houve fogueira

Aportou
Mares
No momento
De fuga

Floriu desertos



11.8.10

VIDA

De sopro
A sopro
Assopra
A sopa

Esse caldo
Ora espesso
Ora ralo
Que desce
Entala
Na goela

De brisa
A ventania
Sacode
Ventanas

Essas garras
Vezes secas
Vezes molhadas
Que grudam
Escorregam
Nas mãos

E a chama oscila

10.8.10

AMÉM

Oh,
Pequei senhor!

Cometi
Tudo
Livremente

Difamado
Com unhas
Dentes
E espasmos

Foste tu
Ou os homens
A inventar
Regras?

Quanta blasfêmia!

Nem sei tua cara
Ou se posso ter-te
Coroa

Pequei
Com elegante
Auxílio
Dos Deuses
Meninos

Assim conquistei
Mundos
E meninas

Meu céu
Nunca perdeu
A exuberância,
Não fui castigada
Em cruz

Cruzes!

Quiseram
Que eu dançasse
Em fogueira
Mas as fagulhas
Que ejaculei
Explodiram
Em estrelas

9.8.10

URRO

Arranco
Minhas cicatrizes
Com os dedos

Os mesmos
Que acariciam
Seu nome,
O mesmo
Que escrevo
Sob minha pele

Cai no sangue
E me coagula

Sou toda apetite
Da boca para fora

Por dentro
Fome

Urro

CORUJINHA

Ela me olhou
Nos olhos
Enquanto
Me aproximava
De seu assustar
Urbano

Foi como pousar
Em meu coração
Com garras
Quentes
Em noites
De frio

Mais um passo
Eu dava
Mais me encarava

Presa
Indefesa
Na selva
De pedra

Quis recostada
Em meu peito
A ouvir
O silêncio
Do vento

Outro passo
Outro olhar
Um voo

Já não havia
Silêncio
Só vento
Eco
Em meu peito
Vazio

7.8.10

VEIA (para Léo Tavares - http://mobileazul.blogspot.com)


Olhos me olharam
Densos
No líquido
Palpável,
Pinguei.

Imóvel
Entendi
Que a veia vive.

Pulso
O pulso
Cicatriz.

6.8.10

ESPERA

Dentro
Uma fera
Que me faz
Bela
A cortar
No ar
O silêncio

Rompo-me

Faço-me vento
Em altos
Edifícios
Sem janelas
De proteção

Lanço-me

Colho-me
Frutos
E desperdiço
O sumo
Reservado
À sua boca
Vermelha

Vermelho
É a cor
Que me sobe
A face
Ao não te ver

COBIÇA

Emudeça seu silêncio
Pois quero algazarra
Encaixada
Em meus poros

De tão molhada
Estou seca

E a língua arde

Dispense a bossa
Pois quero samba
Derramado
Em meus pêlos

Insone
De tanto olhar

E a cama pulsa

Durma o depois
Pois quero o agora
Agora
Em minhas mãos

Tempo
De tanta espera

E a água escorre

5.8.10

POETSIA

A poesia
Está viva
Nos olhos
De quem a devora

Aos olhos que a segue
Aos olhos de quem a escreve

A poesia
É minha
Sou dela
E no entanto
Somos livres
Intrinsicamente
Livres

A poesia
Me guia
Eu a cego
Ela dança

Me perco
Em sua trilha
Ela ilumina
Eu danço

E nessa dança
De ritmos
Variados
Somos par
Ímpar
Imãs
De pólos
Invertidos
Que se abraçam

PEQUENA CRÔNICA DE QUINTA

As crianças entram em minha vida como estrelas. Sem anunciação. E me acendem com muito fulgor! Essa semana ganhei uma nova amiga, Rafaela, uma vizinha que na sabedoria dos seus 7 anos revela ser a flormosura do condomínio. Ela e seu cãozinho Billy me surpreenderam essa manhã ao soar a campainha. Sim, ela me rastreou! E pouco se importou em me encontrar descabelada e com meias azuis, veio com a pura e encantadora certeza de que pode contar comigo nesse mundo estranho de adultos. Não resisti ao convite de, juntas, passearmos ao sol com nossas companhias caninas. Papo vai, papo vem, ela observa que o lhasa com minha sapeca viralata-galgo não sossegam, que seriam um livro de cem mil páginas! Eu tentei argumentar que 'não poderia ser um livro tão grande, pois não teríamos tempo de ler', mas ela me explicou que leria em dois dias. Estou certa que sim.
A velocidade dos passos narrava os causos. Ela quer ser veterinária desde os dois anos e quis saber o que penso dos animais em extinção.

_ Tem um elefante com chifre que não sei o nome, igual ao do filme A Era do Gelo.
_ Ah, o Manny? É um mamute!
_ Você já viu um?
_ Não!
_ Deve existir só uns cinco no mundo todo... Na verdade nem deve existir mais.

E a maldade humana cava buracos nos corações dos pequenos.
Ela me contou que a mãe viu uma reportagem, mas que não sabia se era reportagem, mas passou na televisão, sobre pessoas do bem que arrancavam os chifres dos bichos e das bichas e deixavam no chão para que os caçadores encontrassem e, dessa forma, não os matassem.
E a bondade humana planta reflexão nas cabeças dos miúdos.

_ Posso ir na sua casa depois para gente conversar?

Minha casa são meus braços que estarão sempre abertos a criançada. Eu criança a desbravar a Terra do Nunca. Eu Pan no pandemônio para que minhas asas sempre cresçam.

E meu solilóquio de quinta é interrompido.
Adivinhem por quem?

4.8.10

CIGARRA


Com o corpo
Quente
Canto
Chuva
Em sua janela

Pouso
Meu invólucro
E voo
Noutras
Paisagens

Atinjo
Alturas
Cavo
Com unhas
Seu fio
Terra

No solo
Sozinha
Anuncio
O calor
Do verão
Que virá

Verde

Enquanto
Me despeço
Com amarelo
Sorriso

3.8.10

PEQUENA CRÔNICA DE TERÇA

Caminho pelo Setor Comercial Sul e respiro a prostituição, não das moças que se esquivam de carros na miopia da vida, mas dos protótipos a candidatos, dos protótipos que bajulam os protótipos a candidatos e daqueles que se entregam à míngua a fim de extorquir migalhas dos mesmos protótipos a candidatos. Vale tudo na autoeleição, seja de quem disputa vaga no setor público, seja de quem disputa público nas calçadas. O circo aboliu a lona. O palhaço esqueceu a bola no nariz. O equilibrista usa a corda para se enforcar. Pelo bem, pelo mal o show tem que continuar, de tempos em tempos, de agosto a agosto, mesmo com gosto insosso.
Caminho pelo Setor Comercial e perco o norte, cai dos meus bolsos sem emissão de barulho. Perco qualquer sinal de alegria, alheia, se abaixo para enlaçar o cadarço. E alguém procura estacionamento na cabeça de outro alguém. Um camarada leva um caldo de algum cana. Um flanelinha ajeita a gravata. Um pastel é sacudido pelo vento.
Caminho pelo Setor e setas me acuam. Não cruzo as pernas e assumo estar na dança 'prostitulation', mas ao abrir o espelho entendo que nada pode ir contra a própria natureza. Com as pontas dos dedos sinto as protuberâncias das espinhas que visitam minha testa, atestado de que não tenho moldes, minhas costuras eu mesma traço. Alguém buzina e me traz profunda saudade do Abelardo. Me traz vontade de ir para casa fazer chacrinha.

2.8.10

PEQUENA CRÔNICA DE SEGUNDA

Resolvi escrever uma crônica, e se é crônica, é latente, expressa urgências momentâneas. Aquilo que nos faz querer soltar o verbo, mesmo que seja silábico.
Penso nos títulos que o sistema impõe como se fossem papéis de cartas, selos, figurinhas, tampinhas, carrinhos... Algo 'colecionável', sem mencionar que possuir algo, em série, é sempre temporário. O que não o é?
Existe uma ostentação de identidade entre o emissor, a mensagem e o receptor, muitas vezes o questionador da tão usual ‘o que você é?’. Deve ser por isso que o mundo é pequeno em sua voracidade. As pessoas acreditam ser o que são. E muitas vezes o são mesmo, mas são só isso.
Não carrego emblemas, almejo a cada dia mais céu para minha liberdade. Se posso ser o que quero, para que me ater a só uma possibilidade, ou a duas, ou a três quando posso ficar de quatro sem receios? Ser uma aventureira, ser poeta, ser malandra, ser atriz... Ser brincando de ser sendo.
Sou uma novidade a cada estação, um rompante a cada instante, uma arte a cada olhar. Sempre verde! Em constante estado permanente de parto. Se "nascer é uma alegria que dói", a dor é uma alegria que nasce. Minhas dores são tatuagens, marcam com prazer. E com prazer é mais caro, meus caros.

TRIZ

Equilibrista
Em papéis
Voadores
Que transitam
Livres
Meus pensamentos

De galho em galho
Eu cipó de mim mesma

Com raízes
Mutantes
Nos fios
Curtos
Do cabelo

A um triz
De precipícios

ESPELHO

Meus olhos
Estavam mais negros

Jabuticabas
Desvairadas
A correr
Pela boca

Engoli-me
Toda
Sem saber
Meu tamanho

31.7.10

CARDIOGESTIONAMENTO

Engatei a quinta
Levei marcha ré
É hora de pisar
Fundo

No freio

O amor
Não tem ponto
Morto

MANHÃZINHA


Pelo retrovisor
O passado
Passava
Enquanto
O marinho do céu
Clareava

E apagava
Postes

A manhã
Aconteceu
Sabor chocolate

28.7.10

CORAÇÃO DE TIA

Não calculei seu tamanho
Dentro do útero
Mas preenchia
Meu coração
De tal forma
Que a beleza
Da lua
Que irradiava
A noite
Tornou-se coadjuvante

Já era tão meu
Sem ser dele
(Ou dela)

Menino
Ou menina
A pessoa
Responsável
Por minha alegria
De tia?

NAS ALTURAS

Cadê a poesia?
O gato comeu
Subiu no telhado
E ninguém mais viu
Pois ela da lua
Se enamorou

26.7.10

TURQUESA

Que azul!
Hoje o céu está assim
Absoluto
Em sua soberania
Espalhafatosa

O saúdo
Como em dia de Pátria
Com o queixo
Na linha no horizonte

Temos nossos segredos
Atravessamos
Tempos

25.7.10

COERÊNCIA

Na boca
Explode
A menta
Que me atiça
O beijo:
Hálito

Na caneta
Explode
A tinta
Que me atiça
O verso:
Hábito

Com a boca
No mundo
Da palavra

Passo a passo

TRINDADE

Puxo pela memória
O alecrim
Das cantigas
De roda
E bailo
A vida

Solto a fita
Do presente
E revelo
O espelho
A me revelar

Abro a janela
E semeio
O futuro
Florido

Sou o que fui e o que serei
Amém!

RAIO X


Estou
A me esperar
Sem marcar encontro

Me frequento

Sou o tempo
Que me concedo

Não bato ponto

Ponto.

24.7.10

BOM

Só é bom
O que fica
Na vontade

Aquilo que se estica
Em braços
No futuro
E é anunciado
No pôr do sol

O sorriso riso
Que paira
No ar,
A contradança
Não dançada
A mala por fazer
O penteado por desarrumar

O bolo
A ser cortado
De chocolate,
A música
A ser ouvida
De verdade

O filme marcado
O telefonema esperado
O orgasmo desejado

O chinelo em casamento
A paz em tormento
O zero em investimento

Só é bom
O que vai
Na saudade

FAÍSCA

Pegou fogo
No meu corpo
Mandou ver

Tombei
Simplesmente
Tombei

Dancei
A noite toda
Com você
Refletida
Em meus olhos

23.7.10

NHAC


Sobe-me
Um arrepio
Pela nuca

Desce-me
Uma quentura
Pelo umbigo

Mexcita
De dentro para fora
De fora para dentro
Sou toda Tzão
Nesse domingo meio azul meio amarelo

DESALINHO

Cabia
Confortavelmente
Dentro
De um pensamento
Que surgia
Em horas impróprias
Cabia
Dentro
De mim

Tal motivo
Por não
Acontecer
Fora

Fora isso
Tava tudo bem
Em desordem

22.7.10

ESBOÇO

Vivo
A rabiscar
A vida
A morte
E os avessos
Todos
Que coçam
Meus pensamentos

Num corpo
Que pula
Expurga
Vibra
Acomete
Fluidez

Às vezes
Não dou conta
De mim

Escapulo
De minhas mãos
Fujo
De meus pés
Cego
Meus olhos

(Às vezes)

Noutras
Encolho-me
Em coma
Nos meus escuros
Detalhes

Apago
Minha luz
Por vislumbrar
Na penumbra
Rastros
Dos meus anos

Que dilatam-me
Os poros
Em pêlos
Negros

Pelo sim
Pelo não
Continuo
A rabiscar
A vida
A morte
E os tropeços
Poucos
Que abstraem
Meus sentimentos

21.7.10

PONTEIROS

Sequestraram o tempo
De nossas próprias mãos
Arrancaram-nos
Sem que percebêssemos
Pois estávamos distraídos
Com o banal
Que suja as pontas
Dos dedos

O tempo passou
E passa
Quando acreditamos
Em sua inércia

Somos títeres
De deuses
Invisíveis
Que duelam
Com fantasmas,
Somos marionetes
À mercê
De uma mercedes
Conversível

Da sorte
Dos dados
Dos passos
Apressados

Estamos atrasados

Lá fora o sol
Urge
Quando engavetamos a lua

Nós engravatados
Com pés
Sobre gravetos
Frágeis:
Metáfora cotidiana

Sob as unhas
O lodo do dia
O casco do trote
Nenhuma euforia
Sob as unhas
Eu dormia

E o tempo corria
Em pesadelo
Arrastando
O fulgor
Que deveria ser natural
Dos olhos

20.7.10

NO METRÔ


A multidão
Silenciosa
Escora
O suor
De um dia

Portas
Abrem e fecham

Ouço
Celulares
Vejo
Sacolas
Leio
Livros e impressos
Alheios

Olhares
Entrecruzam,
Pensamentos
Fogem

Alguém
Sorri
Alguém
Chora

E a cidade
Se ilumina
Para dormir
Equanto o trilho
Grita que acorda

19.7.10

DE REPENTE, DANDHARA


Há 4 anos
Ela chegou
Ateando alegria

Me fez tia

Há 4 anos
Ela chegou
'Atiando'

18.7.10

LUBRIFICANTE



Como um fio
De azeite
Pousou
Sobre mim
Um suave
Líquido
Espesso

Dos pés a cabeça

Molhei os dedos
E mergulhei fundo
Fundo
Fundo

Nos seus olhos

17.7.10

JANELA

A manhã
'Ensolarava'
A pulsação pusilânime
Vertia tambores
Enquanto a quietude
Estatelava
O azul
Que influenciava outras cores:
Ciranda poética

A tarde
Sobreviria
Sestrosa
Para que a noite
Flutuasse
No limite
Inexaurível da lua

CALMARIA


Desdobro-me em paz
Para que recoste
O corpo esguio
E sonhe
O sonho que nunca entenderei

Por ser mistério
Entre bichos
E homens

Mas o olhar amendoado
Me diz
Tudo
Que preciso
Saber

É quando meu coração
Bate alvoroço
Puro

DATILOGRAFIA

Escreve sobre minha pele
Preenche meus poros com pontos
Desliza com vírgulas, minhas curvas
Salpica reticências nos meus cílios
Me deixa totalmente entre aspas

ESCULACHO

Ora bolas!
Quedou-se
As carambolas

Meus dedos
Perderam
O tato
Que esculacho!
Perdi o rebolado
Ao sair
Ao encalço

Poxa vida!
(Des)fiz-me
Em rimas
Dei vexame
Entornei o vasilhame
Escalei qualquer andaime

Meu Deus!
Não sei o que me deu

Convidei prosa
Aceitou poesia

(Versou meus dias)

15.7.10

PERDIGOTO

A chuva
Estava torrencial


Brigava com lixos
Telhados
Pessoas,
Carros
Móveis
Cachorros


Brigava
Com aquilo
Que tentasse lhe impedir


A chuva
Estava fenomenal


E no meio
De tanto
Sangue
E grito

Uma voz
Me acalmou:


_ Venha! Nasceu uma flor em nossa janela!

33 ANOS


Inevitável
Percorrer
O caminho
Percorrido

Tantos passos
Seguros
Na contradição
Bambos
No fixo

Inevitável
Saber
O que nunca
Foi dito

Tanta boca
Escancarada
No silêncio
Calada
No grito

Inevitável
Sorrir
O lamento
Perdido

Tanto choro
Seco
Na garganta
Molhado
No piso

Inevitável
Querer
A flor
Do pico

Tão dura
Na mão
Suave
No istmo

Inevitável
Viver
Não sendo
O que sou:

Isso





14.7.10

INSOLÚVEL



E o amor se enrosca na memória
Saudade é um passarim que me bica para cantar seu nome
Coisa de amigo, é o que sempre digo
Não tem ano que separa
Nem distância que aparta
Porque o que mora nos olhos
Pula dentro do coração

13.7.10

TRANSLAÇÃO

As pálpebras
Acomodam
O sono
Do sol

As unhas
Sustentam
A fragilidade
Da chuva

Os lábios
Ciceronam
O voo
Do vento

As mãos
Moldam
A textura
Da terra

Ah!

Para que meu sexo
Pulse
O teor
Do seu fogo

PAUSA


Descerro a cortina
E cerro os olhos
Ao pé da serra
Que encerra
A caminhada
Quando é chegada
A cama

As folhas
Sacodem
Sem vento,
Acodem
Sem tempo
As rolhas

É cara
A partida,
Mostra-se a cara
Na ida

E o corpo
Frio
É uma carpa
Sem brio

No sombrio
Vale
Que vela
A vala

12.7.10

SOLTA


entra
diariamente
naquilo que sou
faz bagunça
das boas
e nem desconfia

me arrepia

sai
sorrateiramente
daquilo que voo
organiza
na boa
e acredita

me ensina

11.7.10

TRANSPARENTE


Conheço-te sem conhecer

Absorvo o que maximiza
Dessa alegria desgarrada
Que esvai de seus dedos

Sorri como quem pisa na lua
Monta dragões
E cospe fogo em fogueiras

Retém todo o tempo

Conheço-te sem conhecer
Mais quando chega
Do que vai embora

Mais quando deposita poros
Em minhas mãos
Que quando recolhe roupas íntimas

Reconheço-me em você
Nos potes lacrados de felicidade
Só abertos a quem tem saliva
Nessa época de secura

Reconheço-te em mim
Quando faz viagem espacial
No oceano
Multicor
E chora
Sem pudor

8.7.10

CAMINHADA

Quando passeio com Frida
Minha cadela
Respiro o agora

Não procuro rostos
Em nuvens
Nem formas
Em rostos

Permito que ela me leve
Leve
Mesmo se apressa
Os passos

Permito
Entender
A força do acaso

E foi assim
Que essa manhã
Estendi a mão a Carlos Alberto
Nem Drummond
Nem Fernando
Mas um senhor esperto

Que me contou confidências
Eu lhe contei estrelas

Tudo no meio da rua
No meio da gente
E da gente que passava
Sem espiar
Que a vida não para
Quando para


7.7.10

FÉRTIL

Meta-me
Os dedos
Meta-me
A língua

Tenha-me
Por meta

E tenha pressa

Pois escorro
As pernas

BIRRA


não gosto
quando você
desaparece
dos meus dias
e não aparece
nas minhas noites

GALHOS



Minha árvore
Genealógica
É analógica

Estico e podo
Meus galhos
Que se eriçam
Ao vento
E crepitam
Ao sol

Na ponta
De cada um
Deles
Um causo
Estelar
A alumiar
O breu
Que acolhe
As dúvidas
Em caixas
De madeira

Vejo meu pai
Minha mãe
Meus irmãos

Cada qual
A semear
A fertilidade
Que carrego
No ventre
Por onde
Passo
Por onde
Paro
Por onde
Pouso

Aprendi a pedir
Licença
E arrombar
Corações

Desaprendi
A tocar campainhas
E trancar cofres

Minha árvore
Genealógica
É minha
Lógica

6.7.10

ESTIMA

Quero beijo
Que salive
Gozo
Que escorra
Água
Que transborde

Quero o tilintar
Dos cristais
Dentro das cavernas
Pontiagudas

Quero mãos
Ásperas
De poesia
Para me esquentar
O fogo
Que voa
E o bafo
Morno
Me assoprando
A nuca
Branca

Quero o silêncio
Dos monges
Dentro
Dos orgasmos
Escandalosos

Quero pés
Colados
Aos meus
Por baixo
De cobertas
Em cima
De gramas

Quero chuva
Fina
A acariciar
O rosto
Forte
A movimentar
O corpo

Quero o sol

Por fora
Por dentro
Por fora
Por dentro

Por dentro

4.7.10

CIGANA (para Nanda Barreto: http://transitivaedireta.blogspot.com/)


a porta estará aberta
ao que torna verde
os dias
ao que tem cheiro de mato
molhado

seguirei descalça
nua
descabelada
de mãos dadas
com as sementes e os baús

conte-me tudo
ao pé do ouvido
sem titubear

quero saracotear a vida
como a um mergulhador
que descobre os segredos
da escuridão

e nela acender uma vela

quero suas mãos que me são claras
e nelas percorrer as linhas

em troca ofereço meus dedos
longos e cravados

tudo agora
tudo instante
na multiplicação dos segundos

um riso nunca é a toa
assim como um balão
nunca voa em vão

2.7.10

FREVO


Me escondi
Sob a sombrinha
Da menina bamba
(Me encontrei)

Ela rodopiava leve
Eu bebia a ressaca
Das estrelas

Ela foi dormir
Eu acordei
E a sombrinha
Vestida de joaninha
Ensolarava o carnaval
Fora de época

OUTRA ESTAÇÃO


A primavera acabou
Restaram as folhas secas
E caídas sob meus pés
Molhados

O vivo do vermelho
Ficou para trás
Com o brilho daquele sol
Que a chuva apagou

O coração secou
Como a uma amora
Que se perde na grama

E assim
Distraida
A criança pisa
E o colorido ressurge
Forte
Como aquarela
Na infância

Já é verão!
O calor virá
Os amores virão

29.6.10

PULULA


Os pensamentos estavam vivos
Como pipoca em panela
Saltitavam
Entre passado e futuro

E o presente
Pegava fogo por descuido

28.6.10

CASA DOS SONHOS

A casa
Dos sonhos
Tinha as paredes
Da cor do sol
E muita confusão
Sentimental

Até o impossível
Era possível
Até o abstrato
Era real

E os sonhos iam e vinham
Cresciam e diminuiam
Voavam e aterrisavam

A casa
Dos sonhos
Não tinha portas
Mas tinha chaves
Não tinha chaves
Mas tinha portas

A casa
Dos sonhos
Era sonhada
E por isso
Não existia

Por ser sonhada
Existia mais que o imaginado
E esse sonho
Nunca mais seria acordado

POETINHA


'Seu' Vinícius
Foi meu professor
De amares
Meu padrinho
De quereres

Aprendi e sofri
A lição

Vivi
Vini

Moraelizei
À décima potência
O que não se explica
Com razão

DO CONTRA


Escrevo torto
De propósito
Sou inversa
Sou do avesso
Fico à vontade
Na contramão

Deixo pistas
Planto provas
Qualquer sinal
Que me contradiga
Que delate
Meu desajeitado coração

Faço essa rima
Boba
E babo
Na palma da sua mão

PRECISÃO


Traço uma linha
Imaginária
Entre nós
E cubro
De poesia
Todas as retas
Todas as curvas
(As suas)
Que me escapam
Das mãos

Escrevo entrelinhas
Fora do alcance
E cavo verbos
Indiretos
Diretos
Que magnetizam
Os pés

Sou um poço
Cartesiano
De escolhas
Das palavras
Que invento

NASCIMENTOS

1.
Se as lágrimas
Saltam
É sinal que o corpo
Está pequeno
Para tanta vontade
É o instante
Em que não cabemos em nós
Por querermos voar
-----------------------------------------------
2.
Se a lágrima
Salta
O corpo
Está contraído
De vontades
Nesse instante
Não caibo em mim
Por querer voar
...
Só não sei
Onde estão minhas asas

27.6.10

SOPRO

A cortina
Balançava suave
E azul
Num balé descompromissado

Manhã amena
De sol
A desenhar no teto
Abstrações cotidianas

Um livro era lido
Um chá fervido
Um dia engolido

E nas pálpebras
O calor

PERIÓDICO

Fez a assinatura
De um jornal
E ele vinha
Em branco
Sem notícias
Claro
Como deviam ser os fatos

Dia após dia
seus leitores
Escreviam uma nova história

E o mundo
Tingido de cor
Anunciava
O cinza
Que não mais havia

24.6.10

CAOS


Penso nos germes
E nos vermes
Inquilinos
Dessas crateras
Que absorvem a poeira

O mundo anda imundo
E a água não mais desagua

Eu no centro
Sem saber se observo
Ou sou observada

Eu calada
Pela língua
Minha melhor arma
Eu inerte
Pelo sonho
Meu melhor teste

Eu desarmada e inconteste

Penso nos germes
E vermes

TRAJETO


Inauguro o pardo papel
Com minha poesia
De sangue
Que me aquece e esfria
As vontades

Já é tarde
No céu
E um sol prepara a despedida
Nem louca
Nem tímida
Enquanto aguardo a partida

A minha

Cabelo ao vento
Mochila nas costas
Mundos na cabeça

É São João
Não acendi fogueira
Mas meu coração
Em brasa
Iluminará a estrada
Que se agiganta
Sob meus pés

Que hoje fogem
Do amanhã
Para que o ontem
Nunca termine

23.6.10

IMENSIDÃO


O vale está deserto
E um lobo
Espreita
A solidão
Que ecoa azul

Não há silêncio
Quando é só silêncio
E nem há barulho
Quando tudo rui

O vale está deserto
E meu lobo
Atinge
O cume