31.7.07

UM FALSO BRANCO


Queria uma metáfora que traduzisse uma mudança repentina, que simbolizasse aquilo que surge como chuva num dia de sol. Pensou no fósforo que é aceso sem saber se será queimado ou se uma corrente fria mudará seu destino. Pensou no bolo que sai do forno sem saber em quantos pedaços será cortado. Saber! Objetos inanimados sabem algo? A velocidade tinha muitos tempos, não era precisa. Um mês poderia parecer a eternidade ou a noção que temos dela. O controle está num painel imaginário que acionamos de luzes e fingimos ir e vir. Alguns, de fato, somos livres. Percorremos caminhos estreitos como se usássemos patins, com a sensação de chegar antes do combinado. E se isso é sentido com percepção, é merecido ganhar uma medalha, às vezes é dolorosamente importante despertar a consciência de que movemos, ou percebemos que o chão está em movimento.

Queria apenas um pedaço de papel em branco onde pudesse deslizar a grafite e refletir sobre os mundos do mundo. Colecionava os pedaços como álbum de figurinhas, como se protagonizasse uma aventura inesquecível. Adorava existir, mesmo se significasse tropeçar em pedras invisíveis. “Viver ultrapassa qualquer entendimento”. Perder aquilo que está em mãos pode ser uma celebrada sorte. Cultivar paciência e ter coragem de seguir adiante é um risco cirúrgico, e se alcançado com maestria, é um sorriso que nasce na escuridão.

Ficou observando o relógio digital que marcava 19h28, somava números, 1 + 9 = 10 = 1 + 0 = 1. 2 + 8 = 10 = 1 + 0 = 1. 1 = 1 ou 1 + 1 = 2? Era duas, duas metades de uma construção inacabada. Sempre fugia da vistoria das peças mais delicadas. Era e não era.

Queria uma metáfora e um pedaço do que era observado. Pensava e colecionava raciocínios. A terra girava no escuro e nesses momentos sabia que era e não era.